Ai Weiwei ao virar da esquina
Fica ao Beco da Arruda, é imponente, é o artista em plena actividade criativa. Está nu. Depois de ter começado a aparecer pintado nas paredes de Hong Kong, Ai Weiwei está em Macau. Em forma de graffiti, pois claro.
Isabel Castro*
Mal se soube que tinha sido detido, começaram a nascer nas paredes de Hong Kong representações do artista chinês com maior reputação internacional. Agora, Macau também tem o seu Ai Weiwei – fica no Beco da Arruda e está nu, como naquele trabalho fotográfico que fez e que, dizem, lhe valeu a acusação de bigamia.
Mas nesta parede não há mulheres. Só Ai, com uma trincha na mão, ainda manchada de branco. Foi este ‘Ai Weiwei’ que pintou os caracteres que se encontram do seu lado direito – e que significam ‘liberdade’. Traços brancos sobre fundo preto, junto a um imponente Ai em tons de creme e castanho.
A enorme representação em graffiti do artista e activista chinês – cujo paradeiro se desconhece desde o início de Abril – não está sozinha na parede do Beco da Arruda. Há outros desenhos nas imediações, que nasceram primeiro. Há já algum tempo que se lê “Start from zero” em garrafais letras pretas impressas sobre fundo branco, uma frase que se foi multiplicando em graffitis mais pequenos: é o nome pelo qual responde um grupo de arte de rua de Hong Kong, que poderá ser o responsável pelo Ai Weiwei de Macau. Numa outra inscrição, mais uma remissão para Hong Kong, que talvez não passe de uma coincidência: “Ngau Tau Kok” é a zona de Hong Kong onde foi pintada a polémica cabeça do artista chinês.
O grupo “Start from zero” foi fundado na região vizinha por Dom, um artista de rua. A designação escolhida, lê-se no site oficial dos artistas, vem de dois conceitos diferentes: por um lado, o fundador deseja que, quando as pessoas olhem para os seus desenhos, comecem também a fazer arte de rua a partir do ‘zero’; depois, “é um slogan para encorajar as pessoas quando estas se sentirem infelizes e miseráveis”. O grupo teve em exibição uma exposição em Macau – “Brick the wall” esteve até à passada sexta-feira no espaço comercial Headz. Do site não consta nenhuma imagem de Ai Weiwei como tendo feito parte da intervenção na RAEM.
Obra e receios
Se é verdade que Ai Weiwei tem um reconhecimento internacional indiscutível anterior à sua detenção, não é menos certo que o facto de ter sido levado pelas autoridades chinesas para parte incerta, acusado de crimes que muitos não acreditam que tenha cometido, fez com que se tivesse tornado ainda mais popular. As notícias sobre o artista e activista têm-se multiplicado nas últimas semanas, bem como as manifestações de solidariedade para com Ai. Chegam sobretudo do Ocidente – ao qual a China já recomendou que não interfira em assuntos judiciais internos – e da esfera artística.
As obras de Ai têm sido também muito procuradas: em itinerância anda uma instalação de escultura, uma representação dos signos do zodíaco, que foi inaugurada em Washington e que se encontra agora em Londres.
De San Diego chegou a notícia de que o museu de arte contemporânea local comprou duas peças do artista, “Cadeiras de Mármore”. Ai Weiwei recorre com alguma frequência a cadeiras vazias no seu trabalho, uma imagem que ganha agora mais significado atendendo a que deixou de estar publicamente visível. O museu de San Diego anunciou para amanhã um protesto em silêncio no centro da cidade: são 24 horas em que duas cadeiras tradicionais chinesas vão estar à disposição de quem se queira manifestar pelo que está a acontecer ao artista chinês. A ideia é estarem permanentemente ocupadas.
Pequim limitou-se a dar a indicação de que Ai foi detido por crimes económicos e bigamia – crimes que parecem não convencer aqueles que, não conhecendo o artista, sabem do seu grau de activismo. Entretanto, a família voltou a falar à imprensa: Gao Ying, a mãe de Ai, pede ao mundo que salve o seu filho.
Em entrevista à CBS, a progenitora explicou que quando perguntou às autoridades por que razão tinham levado o seu filho, responderam-lhe apenas que estavam a investigar se Ai Weiwei estaria envolvido num ‘evento’. “Perguntei que ‘evento’ era e não me disseram. Eu disse-lhes que podia garantir que o meu filho é só um artista”, contou Gao, que assegura que o descendente não tem nada que ver com as Falun Gong, o grupo do 4 de Junho ou as chamadas para as “revoluções de jasmim”.
“Julgo que, na realidade, ele foi levado por estar a proteger os direitos de cidadãos comuns e a falar por eles. Com muitas coisas a acontecer, ele tinha de falar, explicou-me um dia”, continua Gao Ying, que chegou a pedir ao filho para ser mais comedido na crítica, por “haver um grupo de pessoas que pensam que ele é uma ameaça”.
Na entrevista, a mãe de Ai deixa um apelo: “Salvem o meu filho. Salvem o meu filho. Ouvi dizer que ele está a sofrer – estão a tratá-lo com crueldade”. “Espero que esta informação não seja verdadeira”, acrescenta. “Mas não duvido dessa possibilidade. Espero que se o meu filho tiver mesmo violado alguma regra, que o punam de acordo com o que fez, mas não de uma forma cruel e desumana.” Gao não acredita que Ai Weiwei seja libertado nos próximos tempos: “Agora que o têm, não o vão largar”.
* com Stephanie Lai
Nenhum comentário:
Postar um comentário